A revista
Cláudia do mês de dezembro, da Editora Abril, disponibilizou a #TemQueFalar que
trouxe à tona quase 60 histórias de leitoras que sofreram assédio sexual e que
preferiam não expor sua identidade nas redes sociais. Compartilhamos aqui
a matéria publicada na íntegra pela revista na última semana, que destaca a
importância dos pais conversarem com seus filhos sobre assédio sexual.
Nas
últimas semanas, a internet brasileira foi inundada por relatos de assédio
sexual sofrido por mulheres, na maioria, quando ainda eram crianças. Tudo
começou com os tweets de cunho obsceno dirigidos a uma participante, de apenas
12 anos, do MasterChef Júnior, da Band. “Sobre essa Valentina: se tiver
consenso é pedofilia?”, dizia um deles.
O caso
deflagrou o surgimento de campanhas que estimulam o público a dar seu
depoimento. A ONG Think Olga criou a #PrimeiroAssedio, que acompanhou quase 90
mil testemunhos. Promovida por CLAUDIA, a #TemQueFalar trouxa á tona quase 60
histórias de leitoras que preferiam não expor sua identidade nas redes
sociais.
A comoção
chamou a atenção para uma urgência: precisamos falar sobre assédio com nossos
filhos. Mas como? Raras são as escolas que se arriscam a entrar nessa seara, e
as famílias têm pouca instrução e, ao mesmo tempo, muito medo de tratar de um
assunto tão delicado. Com isso, o tema vai ficando de lado, o que só alimenta o
risco.
Um
levantamento realizado nos Estados Unidos mostrou que um a cada seis meninos e
uma a cada quatro meninas sofrerá abuso ao longo da vida. E, segundo a ONG Childhood
Brasil, que combate a violência sexual contra menores, apenas 10% das
vítimas não conhecem os criminosos.
“Evitar o
assédio sexual contra crianças exige o enfrentamento de tabus”, diz a
psicanalista Rose Miyahara, coordenadora de formação do Centro de Referência ás
Vítimas de Violência Sexual do Instituto Sedes Sapientiae, em São Paulo. “Um
deles é o fato de que pode, sim, surgir na família. É preciso ficar de olho.”
Segundo ela, abusadores normalmente não conseguem esconder os sinais mais discretos,
como olhares ou declarações em que forma e conteúdo não combinam. É quando um
tio, por exemplo, diz: “Que bundinha linda desta menina!”, com tom de elogio
pueril, mas cunho claramente sexual. Cabe aos pais, sobretudo á mãe, aceitar
que isso é possível e permanecer atenta.
No lugar
de entrar em paranoia e afastar as crianças do convívio familiar ou social,
indica-se prepara-las para identificar o assédio, tentar pará-lo e pedir ajuda.
Tal educação começa cedo, em casa. Um dos primeiros passos: ensinar os filhos a
nomear as partes do corpo de maneira apropriada á idade e, ao mesmo tempo,
orientá-los sobre o que é íntimo e só deve ser tocado por eles ou pelos pais,
exclusivamente durante a higiene ou cuidados com a saúde. Tão logo possível, a
partir dos 4 ou 5 anos, eles já podem aprender a lavar os genitais sozinhos e
entender que essa é uma tarefa só deles. “Com essa idade, a criança precisa
saber que seus órgãos sexuais são apenas dela e devem ficar guardados”, afirma
Anna Flora Werneck, responsável pela Gestão do Conhecimento da ONG Childhood
Brasil. “Deixa bem claras as noções do que é público ou privado.”
A partir
do momento em que a criança passa a frequentar a casa de amigos e outros
círculos sem os pais, a instrução deve ser mais direta e objetiva. Dada a
gravidade do tema, abre-se exceção a uma regra mestra em educação: responder
apenas aquilo que os filhos perguntam. Quando o assunto é assédio sexual, não
se aconselha esperar que os questionamento surjam. Até porque, quando isso
acontece, pode ser sinal de que algo já vai mal. Nessa fase, os pais precisam
deixar claro o que pode e o que não pode. Converse com a criança e explique as
várias situações que indicam que alguma pessoa a está molestando.
Com a
chegada da adolescência, á medida que os filhos tornam-se independentes e
rebeldes e tudo ganha contorno de controle. Por isso, mantenha o diálogo aberto
desde cedo. Caso o adulto tenha tanta dificuldade de entrar no assunto que o
diálogo pareça impossível, ele próprio deve procurar ajuda especializada. Um
estudo publicado recentemente na revista científica Journal of American
Medical Association mostrou que adolescentes que conversam com os pais
sobre sexo tendem a ter comportamentos mais seguros, com usar preservativos. “É
importante ainda tratar o sexo como algo natural, prazeroso, sim, mas que exige
cuidado”, diz Rose Miyahara. Os pais não podem ter medo de passar por chatos.
Precisam, sempre que for oportuno, emitir sua opinião sobre o que é adequado ou
não, impor regras e limites sem privar os filhos de explorar o mundo.
“Os
jovens devem ter a garantia de que, quando estão em risco, por mais absurdo que
seja o ato que eles ou os amigos tenham cometido, podem recorrer á ajuda dos
pais”, afirma a especialista. Com essa certeza, estarão preparados para fugir
de enrascadas. É preciso, ainda, ficar atenta aos relatos dos filhos e a
mudanças bruscas de comportamento. “A criança dá sinais. Esteja aberta para
percebê-los”, alerta Rose. Entre os sintomas mais comuns estão dor ou
dificuldade para ir ao banheiro, infecções de urina persistentes, falta de
apetite, sonolência exagerada ou apatia repentinas. Se a suspeita for
confirmada, denuncie e peça ajuda. Há três canais para isso: a delegacia, o
disque 100 e o conselho tutelar.
O calor
do momento pode dar a sensação de certa impotência e de risco iminente.
Prevenir a violência sexual, porém, é um trabalho diário e bem-sucedido na
maioria dos casos. Vale a pena encarar essa tarefa.
Para
começar a conversa
Filmes
que ajudam a abrir o diálogo e esclarecer dúvidas sobre o assunto:
Defenda-se
Produzida
pela campanha de mesmo nome, a série está disponível no site defenda-se.com.
Os vídeos curtos tratam com linguagem apropriada para crianças os temas
relacionados á prevenção da violência sexual, como medidas para se proteger,
denunciar e também como diferencias carinho de abuso.
Indicação A partir de 5 anos.
Que abuso
é esse? E que exploração é essa?
Fruto da
parceria ente a ONG Childhood Brasil, que combate a violência sexual, e
o Canal Futura, os vídeos (publicados no YouTube) mesclam diálogos simples
entre bonecos, em um cenário que remete a uma vila, com entrevistas com
especialistas no assunto. É excelente tanto para tirar dúvidas dos adultos como
para ajudar as famílias a abordar o tema.
Indicação
A partir
de 12 anos.
Homens,
Mulheres & Filhos
Centrado
em um grupo de alunos de uma escola e seus pais, o filme, do mesmo diretor de Amor
sem Escalas e Juno, mostra de que forma a internet pode colocar os
relacionamentos em risco, a exposição aos crimes e distúrbios sexuais. Embora o
assédio seja uma história secundária, o drama é uma boa oportunidade para
reavaliar comportamentos e abrir o diálogo em casa sobre temas tão delicados.
Indicação:
Adolescentes.
Confiar
Dirigido
por David Schwimmer (O Ross, de Friends), o filme é um retrato fiel dos
casos de abuso em que as vítimas são levadas a duvidar de que tenham mesmo
sofrido violência. Uma garota á beira dos 14 anos começa a conversar online com
um homem. Ele diz ser adolescente, e ela só descobre a verdade ao encontrá-lo.
Indicação:
Adolescentes.
FONTE: CHILDHOOD
http://www.childhood.org.br/fale-com-os-criancas-e-adolescentes-sobre-assedio-sexual-antes-que-as-primeiras-duvidas-aparecam