Dois casos de violência contra crianças pequenas chocaram os
moradores do Rio em menos de uma semana: na quinta-feira, mesmo dia em que foi
enterrado Wesley Fernandes Araújo, de 2 anos, que morreu após ser espancado - o
pai dele e a madrasta foram denunciados por tortura seguida de morte -, veio à
tona outra denúncia de maus-tratos contra um bebê. A polícia investiga a
agressão sofrida por um menino de apenas 1 ano, que deu entrada, com fratura
numa das pernas, no Hospital Rodolpho Perisse, em Cabo Frio, na última
segunda-feira. Segundo especialistas, embora não se possa afirmar que esteja
ocorrendo um aumento dos casos de pais que cometem violência contra os filhos,
a percepção desse tipo de crime em hospitais e escolas é maior do que no
passado. Eles acreditam que o treinamento de profissionais para lidar com a
questão tem sido o principal fator para o aumento de notificações.
- Maus-tratos contra crianças cometidos por pais e familiares
sempre aconteceram. Mas hoje, quando uma criança aparece com ferimentos
suspeitos, hospitais e escolas são obrigados a notificar. Isso tem aumentado o
número de ocorrências - diz Rosemary Caetano, responsável pelo Programa de
Atenção à Criança e Adolescentes Vítimas de Maus Tratos, da Fundação para a
Infância e Adolescência (FIA).
O pediatra Lauro Monteiro acredita que a violência praticada por
pais contra filhos é uma questão cultural.
- Infelizmente, corrigir batendo na criança continua sendo uma
prática comum. No caso de Jacarepaguá, o pai alegou que batia na criança para
corrigir. Acredito que hoje a sociedade está mais sensível à questão da
violência contra crianças e os médicos mais preparados para diagnosticar casos
de agressão.
Em geral, agressores são os pais da vítima
Para quem trabalha todos os dias lidando com crianças em situação
de violência extrema, os casos recentes não causam surpresa. Segundo Edmilson
Ventura, do Conselho Tutelar de Laranjeiras, a vítima quase sempre é agredida
pelos pais.
- O adulto tende a repetir na criação dos filhos a forma como foi
educado. Se ele apanhou, vai achar natural bater. Hoje, as pessoas se
acostumaram a terceirizar a educação, o que acaba gerando uma conflito de
princípios e de limites - explica.
A psicóloga Ruth Goldenberg frisa que o estresse do dia a dia
causa intolerância nos pais:
- Os pais vivem estressados e acreditam que o processo de educação
é longo. Eles precisam do tempo para agir e resolver outros problemas.
No caso de Cabo Frio, apesar de a mãe ter dito que a criança
estava inchada por ter sido picada por uma abelha, médicos desconfiaram e
chamaram o Conselho Tutelar, que registrou o caso na polícia. O menino, que
precisou passar por uma cirurgia no fêmur, teria se machucado após ser jogado
para o alto pelo padrasto durante uma briga do casal.
O Conselho Tutelar de Cabo Frio está acompanhando o caso, que
aconteceu na localidade Reserva do Peró. Segundo Jandira Teixeira, diretora do
hospital onde a criança permaneceu internada até anteontem à noite, o estado de
saúde do bebê é estável. Ele foi entregue pelo conselho a uma tia da mãe após
receber alta. A delegacia de Cabo Frio vai chamar o casal para esclarecimentos.
Eles podem ser indiciados por lesão corporal dolosa.
Na manhã de quinta-feira, o corpo de Wesley Fernandes Araújo, de 2
anos, foi sepultado no cemitério do Pechincha, em Jacarepaguá. A mãe do menino,
Suely Fernandes, precisou ser amparada por familiares.
- Eu entrego na mão de Deus. Ele (o pai da criança) falou que ia
dar uma vida melhor para o meu filho. Foram buscar o meu filho na minha casa
para matar - disse Suely.
O inquérito que apura o caso já foi concluído pela polícia e
encaminhado à 2ª Vara Criminal de Jacarepaguá. O Ministério Público denunciou
Widenberg de Araújo Sousa, de 22 anos, e Luana Rodrigues do Nascimento, de 23,
pai e madrasta do menino, por tortura seguida de morte e tortura continuada.
Também foi pedida a prisão preventiva dos acusados, que já estão detidos. O
casal pode pegar até 38 anos de prisão. Wesley morreu no hospital depois de
sofrer uma parada cardiorrespiratória. O menino apresentava hematomas e
fraturas nas pernas e no crânio.
A doméstica Micaellen de Araújo Souza, irmã de Widenberg, disse
estar surpresa com o que aconteceu e afirmou que o irmão sempre foi uma pessoa
calma e era apaixonado pelo filho:
- Ele nunca agiu assim, ainda mais com o filho.
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