O estudo do Ministério da Saúde considerou dados de 2011 a 2016
Ao menos sete em cada dez adolescentes de dez a 14 anos que
engravidaram como consequência de crime de estupro foram violentadas em caráter
repetitivo e por um familiar ou um parceiro íntimo.
Segundo a pesquisa, conduzida por profissionais do Departamento
de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e de Promoção da Saúde,
do ministério, o país registrou 4.262 casos de estupro em adolescentes e
que resultaram em gestações e nascimentos no período entre 2011 e 2016. O
número se refere ao chamado estupro de repetição, ou seja, crimes dessa natureza
praticados contra a vítima reiteradas vezes, ainda que não pelo mesmo agressor.
Desse
total, 1.875 vítimas de estupros repetidos, com idades de dez a 14 anos, deram
à luz. Outras 2.387 jovens de 15 a 19 anos, também vítimas de estupro
reiterado, tiveram filhos após violência sexual.
Os números
De
acordo com o levantamento, entre 2011 e 2016, foram notificados 3.266 estupros
de adolescentes de dez a 14 anos que foram mães --o número abarca vítimas de
estupros reiterados ou não. Em 68,5% dos casos (2.324), o agressor foi familiar
ou parceiro íntimo. Em 72,8% dos casos (1.875), o estupro tinha caráter
repetitivo.
Entre
as adolescentes de 15 a 19 anos, o número de notificações foi maior: 6.201,
37,7% delas (2.418), com autor na própria família ou parceiro. O percentual de
casos reiterados foi menor: 44,1% dos casos (2.387).
Dos
bebês nascidos vivos de mães de dez a 14 anos com notificação de estupro entre
2011 a 2016, 53,4% iniciou o exame pré-natal no primeiro trimestre de gestação
--quando esse tipo de acompanhamento médico-obstétrico deveria se iniciar ainda
antes da concepção e até o pós-parto, em um período de 45 dias após o
nascimento do bebê.
"Nossa discussão é de saúde pública, não de religião",
diz consultora
Para
Cheila Marina de Lima, consultora da área técnica de Vigilância de Violências e
Acidentes do Ministério da Saúde, e que atuou no levantamento, os números de
mães adolescentes que engravidaram após estupros repetidos é chocante.
"O
que se vê hoje no Brasil é um movimento de enfraquecimento do direito ao aborto
legal. Sabemos que essas meninas não tiveram acesso nem à contracepção de
emergência [pílula do dia seguinte, por exemplo] e nem ao aborto legal. A gente
precisa voltar a discutir isso com mais vigor. O Estado tem que dar uma
resposta mais adequada", considerou.
Na
avaliação da consultora, existe atualmente uma discussão conservadora na
sociedade que afeta até serviços públicos que deveriam orientar as vítimas de
estupro para as situações em que o aborto é a alternativa permitida e/ou
indicada ao caso.
"Nossa
discussão é só no âmbito da saúde pública, e não de religião A ou religião B.
Mas o que se nota é que até o profissional tem resistência de dar esse tipo de
orientação, e eles precisam ser sensibilizados sobre isso. Há também que se
fortalecer e instrumentalizar as nossas redes de atenção e de referência a
essas adolescentes, além de mobilizarem os profissionais que nelas atuam, pois
os serviços de saúde são a grande porta de entrada dessas vítimas de
estupro", apontou.
A
consultora do Ministério da Saúde, no entanto, ressalva: a rede de atenção à
vítima de estupro não é atribuição única da saúde, "mas também dos
conselhos tutelares e das delegacias da criança e do adolescente, por
exemplo". "É muito doído e muito triste ver que grande parte dessas
meninas sofre violência de repetição --imagine a dor de sofrer isso em casa dia
a dia sem ter a quem recorrer?"
Faltam delegacias especializadas, diz o Condepe
"Boa
parte das violências sexuais ocorre nos ambientes familiares e é
praticada nas residências das vítimas e por pessoas que deveriam
protegê-las, como pais, padrastos, padrinhos, entre outros. Em razão de a
violência ocorrer em ambiente doméstico e da impunidade, é que as situações se
tornam repetitivas e reiteradas", definiu.
FONTE: JORNAL FLORIPA
http://www.jornalfloripa.com.br/mundo/noticia.php?id=48602619
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