O aborto legal de uma criança de 10 anos que foi estuprada no Espírito Santo virou campo de batalha no Brasil; ele é mais um dos muitos casos de estupro de crianças e adolescentes no país; a cada hora, quatro meninas de até 13 anos são estupradas.
Após autorização
judicial, a menina foi levada a
outro Estado no domingo (16/08) para interrupção da gravidez. Ela relatou
que sofria abusos sexuais do tio desde os 6 anos e que não contava para os
outros porque ele a ameaçava. O tio da criança está foragido.
Embora o caso tenha virado pano de fundo de uma briga ideológica e venha sendo tratado como algo inédito, dados oficiais revelam que ocorrem no Brasil, em média, seis internações diárias por aborto envolvendo meninas de 10 a 14 anos que engravidaram após serem estupradas.
Esses casos envolvem procedimentos feitos no hospital e internações após abortos espontâneos ou realizados em casa, por exemplo.
Se o número parece alto para quem não acompanha o assunto,
ele é pequeno perto da quantidade de estupros de crianças e adolescentes que
ocorrem no Brasil: a cada hora, quatro meninas de até 13 anos são estupradas no
país, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019.
"Há uma naturalização desta violência. O pessoal já nem presta mais atenção em menina de 13 ou 14 anos grávida. O pessoal tá começando a prestar atenção na gravidez de 10, 11 anos de idade", diz a advogada Luciana Temer, presidente do Instituto Liberta, que atua no combate à exploração sexual de crianças e adolescentes.
Ela defende, ainda, que só faz sentido tratar desse assunto a partir de um caso específico se for para mostrar que essa violência é muito mais comum do que se imagina. "É uma história tristíssima. E infelizmente é uma de muitas, o Brasil está lotado de casos como este."
Segundo dados tabulados pela BBC News Brasil no Sistema de
Informações Hospitalares do SUS, do Ministério da Saúde, o Brasil registra ao
menos seis abortos por dia em meninas de 10 a 14 anos, em média.
Só em 2020, foram ao menos 642 internações. O país registra também uma média anual de 26 mil partos de mães com idades entre 10 a 14 anos.
Desde 2008, foram registrados quase 32 mil abortos
envolvendo garotas dessa faixa etária.
Se forem consideradas as 20 mil internações nas quais
constam dados de raça ou cor de pele, 13,2 mil envolviam meninas pardas (66%) e
5,6 mil, de brancas (28%). Esses dados incluem abortos realizados por razões
médicas, espontâneos e de outros tipos.
Das 20 cidades com mais internações em números absolutos, todas são capitais, exceto Duque de Caxias (RJ), Feira de Santana (BA) e Campos de Goytacazes (RJ). Não há dados disponíveis sobre o sistema privado de saúde.