No
País com a missão de angariar fundos e firmar parcerias para sua ONG Childhood,
rainha Silvia, da Suécia fala
sobre a luta contra a exploração de menores e seu carinho pelo Brasil.
Filha de brasileira e alemão, a rainha Silvia, da Suécia, se
sente em casa no Brasil. Natural, já que viveu aqui até os 13 anos. No País
para temporada de um mês, a nobre se desdobra em uma agenda de compromissos.
Maior deles? Buscar parcerias e angariar apoio para o braço brasileiro de sua
World Childhood Foundation – ONG que trabalha na prevenção e no combate de
abuso sexual infantil.
Segundo dados da Childhood Brasil, de janeiro a abril foram
registradas 46.111 denúncias de violações de direitos de crianças e
adolescentes – o que representa 35% de aumento em relação ao mesmo período do
ano passado. É nesse cenário que ela faz coro à causa: “É importante trabalhar
na prevenção”, destacou a rainha, que recebeu a coluna na tarde de sexta-feira,
no prédio da Camargo Corrêa. Rosana Camargo de Arruda Botelho, acionista da
empresa, é a representante da ONG no Brasil.
Entre os projetos locais está a concretização de uma iniciativa
da própria Silvia: a sala de depoimento. “Um lugar que ela possa reconhecer
como dela. Tem brinquedos, bonecas… Presente, somente a psicóloga, que faz as
perguntas necessárias”, explica. A primeira do Brasil foi instalada no Rio
Grande do Sul.
Além do trabalho de filantropia, a rainha aproveitará para
visitar seus parentes locais e matar a saudade das frutas brasileiras.
Exemplos: “Jabuticaba e manga”. Afável e atenciosa, com um sorriso nos lábios,
assegura, antes de terminar a conversa: “Meu coração é brasileiro”.
A seguir, os melhores momentos da entrevista real.
Como a senhora teve a ideia de
criar a Childhood?
Foi em 1993, um momento difícil, em que tivemos um caso de
pornografia infantil na Suécia. Na época, o caso chocou o país. Entretanto, o
assunto era tabu. Ninguém tinha coragem de abordá-lo. Então, quando fui à
Unesco, eles me pediram para falar sobre a situação da criança na Suécia, que é
bastante boa, mas tem seus problemas. Pensei que, como rainha, poderia chamar a
atenção para essas questões.
A senhora sempre teve essa
preocupação?
Depois desse caso, senti que deveria falar sobre isso. Naquele
tempo tampouco se falava de abuso sexual e pornografia infantil no Brasil.
Qual a essência do trabalho da
Childhood?
Chamar a atenção para esse problema. No Brasil e em outros
países. Porque os abusos existem em todo lugar e em todas as camadas sociais.
Também procuramos ajudar projetos que já existem e necessitam de recursos. Não
é fácil, para muitas organizações, conseguir trabalhar nesse setor.
Como a ONG escolhe parcerias e
projetos para apoiar?
Atuamos na Suécia, Alemanha, EUA e Brasil. Aqui temos a
Childhood Brasil, responsável por escolher os projetos. Recebo as propostas e
trabalhamos em cooperação. Este ano, estamos apoiando dez projetos no Brasil e
desenvolvendo projetos próprios, de forma contínua. Sempre em parceria com
setores empresariais, a Justiça, os setores de turismo e construção civil.
Nosso mais novo e importante projeto é a sala de depoimento.
O que é a sala de depoimento?
A situação de uma criança que sofreu abuso é muito difícil. E,
às vezes, ela tem de contar essa história muitas vezes, o que é um processo
doloroso. Tem de falar para os pais, médicos, policiais, juízes, assistentes
sociais… Quando o abuso acontece com um familiar, a dor é ainda maior. Esse
trauma é horrível. Essa sala de depoimento é um ambiente feito para a criança.
Ela reconhece como dela: tem brinquedos e uma única pessoa – psicóloga – faz as
perguntas. Do outro lado da sala – atrás de um vidro, a criança não vê – estão
os profissionais que precisam das respostas para dar prosseguimento ao processo.
Tem funcionado?
Muito. Começamos na Suécia. A primeira sala de depoimento no
Brasil foi instalada no Rio Grande do Sul. Depois, inaugurei uma no TJ de
Recife. O governador, Eduardo Campos, foi muito aberto à ideia. Até o fim do
ano serão 100 salas no Brasil. Em São Paulo já são 29.
Abuso de menores é questão interdisciplinar. Envolve assistência social, Justiça, polícia. No Brasil, muitos desses sistemas são frágeis.
Como é o espaço para uma ONG
atuar?
É necessário falar sobre o assunto na escola, para trabalhar a
prevenção e ajudar a criança em caso de denúncia. É essencial que a criança
tenha coragem de denunciar. Porque, em muitos casos, ela é sozinha. A mãe, às
vezes, também tem medo de falar, tem medo de que a segurança da família se
quebre. Por isso a necessidade de apoio social. Nosso dever é estar junto e
ajudar não só as vítimas, mas as pessoas que podem atuar como agentes sociais
nesses casos.
Que porcentagem tem coragem de
denunciar?
Sabemos que esse número é a ponta do iceberg – há muito mais
casos. Mas as denúncias vêm crescendo desde que começamos a trabalhar, o que me
deixa feliz. Este ano houve aumento de 35%, comparando com o mesmo período de
2012. Foram 46 mil registros.
A Childhood também tem um projeto que capacita caminhoneiros para serem embaixadores da causa e denunciar.
A Childhood também tem um projeto que capacita caminhoneiros para serem embaixadores da causa e denunciar.
Como surgiu esse projeto?
A ONG viu o problema e firmou parcerias com as companhias de
transporte. Fizeram workshops com caminhoneiros, para que eles se informassem
sobre os direitos das crianças. Muitos não pensam que uma menina de 14 anos é
uma criança. Por isso temos de falar a respeito. Eles se tornaram embaixadores
e denunciam, se preciso.
No Brasil, as adolescentes
estão expostas à sexualidade muito cedo. Como fazer um trabalho de prevenção?
A mídia tem seu papel. A criança vê filmes, lê sobre a vida de
atores, artistas e, naturalmente, acha que é algo de que deve participar. A
mídia deveria estar mais alerta e não fazer tanta propaganda que induza a
criança nesse sentido. Porque ela tem o direito de ser criança.
Foi difícil para a senhora
captar recursos por aqui?
Não. Todos sabem da gravidade e importância do problema. Aqui
temos um grupo de empresários muito ativos, sempre presentes.
O que acha do governo Dilma
nessa área?
Hoje foi um dia muito importante, porque o ministro Gilberto
Carvalho mostrou preocupação com o problema e disposição para se unir a
empresários. O governo faz muitas coisas, mas o Brasil é enorme. Fazer
parcerias com as grandes companhias seria um bom caminho.
FONTE: SITE BOA INFORMAÇÃO / SONIA RACY E MARILIA NEUSTEIN
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