Para que não haja a
reincidência de abusos sexuais contra crianças e adolescentes é preciso tratar
a família da vítima e até o agressor. Em famílias disfuncionais, o incesto pode
levar até à violência fatal. Segundo a psicóloga e psicodramatista Rosemary
Peres Miyahara, coordenadora da área de formação do Centro de Referência às
Vítimas de Violência do Instituto Sedes Sapientiae (CNRVV) em São Paulo, é
preciso compreender a dinâmica que gera o abuso. A co-autora dos livros O
Fim do Silêncio na Violência Familiar (Ed. Agora) e O
Fim da Omissão – A implantação de Pólos de Prevenção à Violência Doméstica (Fundação Abrinq) explica a
importâncias das diferentes terapias aplicadas hoje em vítimas, familiares e
agressores:
Quais as técnicas que têm sido
usadas para tratamento das vítimas?
Num primeiro momento o foco atual é tentar ver como a criança
viveu a experiência de violência e ter o cuidado para não estigmatizar a
vítima. Não é incomum ela ter danos psicológicos bem sérios. Ela necessita de
espaços mais reservados para falar. É preciso trabalhar um contexto mais
amplo com toda a família, porque há casos em que todos abusavam da pessoa. No
CNRVV, trabalhamos com grupos de crianças, de adolescentes e também o de
responsáveis (a mãe ou avó). Os profissionais se juntam para reunir os
dados e o que aparece nos desenhos nas histórias e dramatizações. A
terapia começa a partir de uma avaliação de como a criança viveu aquela
história e pode ser em grupo ou individual. Aqui se procura respeitar a
especialização dos terapeutas, que atuam com psicanálise, terapia sistêmica ou
psicodramaturgia.
Como se sentem as mães que precisam levar os
seus filhos abusados ao tratamento?
Elas geralmente se perguntam se tiveram alguma culpa por não
terem visto que os filhos estavam sendo abusados.
Vocês atendem agressores também no CNRVV e
como são os tratamentos?
Atendemos, mas nosso foco é a infância e a juventude.
Normalmente são indicados para outros serviços, quando a criança está sendo
atendida aqui, porque a maior parte dos casos é permeada de ameaças. O
tratamento de agressores ainda é um tema recente no Brasil e no mundo e
geralmente é realizada a castração química ou prisão. Alguns serviços têm
trabalhado com a terapia comportamental cognitiva, conscientizando o agressor
do dano que causaram ao outro para, a partir daí, haver uma reformulação de
comportamento. Hoje, pesquisas feitas com sentenciados mostram que eles não
admitem que cometeram o abuso, todos negam.
Vocês já detectaram casos em que a mãe para se
vingar do ex-marido faz a criança contar e acreditar na história de que foi
abusada?
Estes casos são raríssimos, mas existem e são chamados de
síndrome de alienação parental, mas conseguimos detectar com técnicas, como,
por exemplo, verificando os titubeios e as contradições da história.
Há muitas notícias sobre pedofilia na
imprensa. Esse comportamento está crescendo?
Precisamos prestar atenção em como a cultura está sendo
difundida e não simplesmente falar que o número de pedófilos está crescendo.
Nem todo abusador é pedófilo. O pedófilo tem um transtorno psiquiátrico que
precisa de tratamento. O abusador sexual responde a algo que é muito difundido
na nossa cultura: o desejo pelo corpo jovem e infantil. A erotização aparece,
por exemplo, quando se faz um sutiã de bojo para meninas de 7 a 9 anos idade,
para elas logo cedo imitarem as mães. Hoje, não se tem a diferenciação mais de
roupas dos 8 até os 48 anos. Nossa cultura vai propagando isso e assim ficam
diluídos os ritos de passagem e não se conseguem diferenciar as fases. O
abusador é igual ao dependente de uma droga química se ele tem meios propícios
para atuar, ele tem a chance de cometer o abuso.
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